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Protestos contra Assad se espalham por toda a Síria; 35 morreram

Em meio à visita da Liga Árabe, milhares de manifestantes civis saíram às ruas de diversas províncias da Síria, em um dos maiores protestos desde o início da revolta popular. O objetivo seria colocar à prova as forças de segurança do regime do ditador Bashar al Assad para demonstrar aos monitores árabes a gravidade da repressão que, de acordo com a ONU, já deixou mais de 5.000 mortos.
Estimativas de ONGs internacionais como a Avaaz, que mantém ativistas na Síria, e o Observatório Sírio para os Direitos Humanos, com sede em Londres, estimam que ao menos 35 pessoas morreram durante confrontos só nesta sexta-feira. Mais de meio milhão de civis foram às ruas, sendo 100 mil somente na cidade de Homs, relatam as organizações.
Cerca de 250 mil se reuniram depois das tradicionais orações muçulmanas de sexta-feira na província de Idlib, no norte do país, em 74 locais diferentes, segundo o Observatório.
"Esta sexta é diferente de outras sextas. É um passo transformador. As pessoas estão ansiosas em alcançar os monitores e contar seu sofrimento a eles", disse o ativista Abu Hisham em Hama.
Um vídeo divulgado por ativistas no YouTube mostra a delegação da Liga Árabe cercada por milhares de manifestantes na província de Idlib.
Os protestos, iniciados em março, ganharam fôlego com a visita dos monitores do bloco regional, e tomaram as ruas de todo o país, em locais como a capital, Damasco, além de Homs, Hama e Idlib, pontos que vêm registrando intensos confrontos nos últimos meses.
Em Douma, no subúrbio da capital, um dos integrantes da delegação árabe viu-se obrigado a falar com os manifestantes durante uma visita a uma mesquita.
O observador, que pediu ao público que não o filmassem, embora sua imagem tenha sido transmitida ao vivo pela Al Jazeera, afirmou: "Nós, como monitores, não deveríamos falar, mas a situação me forçou a dizer algo: Estamos monitorando os elementos de um protocolo assinado entre a Liga Árabe e o governo."
"Nosso objetivo é observar, não é remover o presidente, nosso objetivo é devolver paz e segurança à Síria", disse, acrescentando que "pelo que ouvi aqui, sangue está sendo derramado".
Um segundo vídeo postado por ativistas no YouTube mostra as manifestações no subúrbio de Saqba, na capital Damasco.
Embora o regime do ditador sírio já tenha sofrido sanções das potências ocidentais e da Turquia, ex-parceiro estratégico na região, a violenta repressão vem sendo mantida nas últimas semanas.
Na ONU (Organização das Nações Unidas), tentativas de aprovar resoluções condenando o regime com mais rigidez foram barradas por China e Rússia no Conselho de Segurança, onde os dois países possuem poder de veto.
 
REPRESSÃO E TRÉGUA

No subúrbio de Barzeh de Damasco, onde grandes aglomerações também foram registradas, os manifestantes seguravam cartazes onde se lia: "os monitores são testemunhas que não veem nada", e gritavam: "Bashar, não queremos você, sírios levantem suas mãos".
Ativistas na cidade de Idlib disseram que o Exército havia tirado da vista suas armas pesadas.
"As forças de segurança moveram parte de seus tanques para fora das ruas da vizinhança e os colocaram atrás de prédios mais distantes", disse Manhal, um membro do comitê de coordenação local. "Eles também moveram os tanques para fora das ruas principais. Alguns eles colocaram em abrigos antiaéreos".
Mais cedo, o Exército Livre Sírio, grupo armado de oposição ao regime, ordenou que suas forças interrompam as ações ofensivas enquanto esperam uma reunião com a delegação da Liga Árabe.
O coronel Riad al Assad, comandante dos rebeldes, disse que suas forças por enquanto não puderam conversar com os observadores da Liga, e que ele está buscando um contato urgente.
"Emiti uma ordem para parar todas as operações a partir do dia em que o comitê entrou na Síria, na sexta-feira passada. Todas as operações contra o regime devem ser interrompidas, exceto numa situação de autodefesa", disse ele à Reuters.
"Tentamos nos comunicar com eles (monitores) e solicitamos uma reunião com a equipe. Até agora, não houve sucesso. Não recebemos nenhum número (telefônico) dos monitores, o que havíamos solicitado. Ninguém nos contatou tampouco."
 
DÚVIDAS EM TORNO DA MISSÃO
 
A missão da Liga Árabe tem despertado ceticismo, por causa da sua dimensão limitada, da sua composição e do fato de depender da logística do governo sírio. O desconforto da oposição com a missão se agravou depois de uma declaração do chefe dos monitores, um general sudanês, que disse ter tido uma primeira impressão "tranquilizadora".
O general sudanês Mustafa al Dabi, acusado por alguns de ligação com crimes de guerra ocorridos na década de 1990 na região de Darfur, fez na terça-feira uma rápida visita à cidade de Homs, epicentro dos confrontos, e disse não ter visto "nada de assustador".
Na quarta-feira (28), a França criticou a delegação árabe. "O pouco tempo de sua estadia não permitiu que apreciassem a realidade da situação que prevalece em Homs. Sua presença não impediu a continuidade da violenta repressão nesta cidade, onde importantes manifestações foram violentamente reprimidas, deixando dezenas de mortos", declarou Bernard Valero, porta-voz da Chancelaria francesa.
Dorsa Jabbari, correspondente da Al Jazeera no Líbano, disse que civis e lideranças rebeldes estão nervosos já que a presença de tropas do regime em torno dos monitores dificulta o contato.
"[Os observadores] estão sendo seguidos por forças sírias, como parte do acordo, e são responsáveis por sua segurança. Por isso, alguns moradores não sentem que têm liberdade de falar com os observadores diante de autoridades sírias", disse.
O ativista Hadi Abdullah disse à emissora que os monitores puderam constatar a gravidade da repressão nesta sexta-feira na cidade de Homs.
"Os observadores viram destruição e muita violência. Um deles perguntou aos moradores do bairro de Baba Amr: como vocês podem viver neste lugar?"

Por Folha